Rumo à COP 30 – Se a transição é inevitável, por que a inovação climática ainda é coadjuvante?
Este artigo é o segundo de uma série especial publicada ao longo do segundo semestre de 2025, no caminho para a COP 30, e foca no papel da inovação climática como elemento central da transição brasileira.
No primeiro artigo desta série, mostramos que o Brasil tem todos os ativos para liderar a transição climática global, mas segue como coadjuvante. Agora, a pergunta é ainda mais incômoda: se todo mundo concorda que o "esverdeamento" da economia é inevitável, por que a inovação climática continua relegada às bordas do sistema por aqui?
A resposta está na forma como ainda organizamos essa transição: em gavetas separadas. Mitigação aqui, adaptação ali, inovação lá no canto. O resultado fica evidente: desperdiçamos a chance de acelerar, diversificar e adaptar nossa trajetória de mudança.
O dinheiro existe, mas vai para o lugar errado. Apesar do boom no financiamento climático global, a maior parte dos recursos segue concentrada em soluções maduras ou infraestrutura tradicional. Sobra pouco para tecnologias emergentes, modelos disruptivos ou soluções aplicadas a contextos socioambientais complexos — exatamente onde mora o potencial transformador.
O contraste é gritante: embora o Brasil já atraia quase 80% do capital de startups da América Latina, esse percentual despenca quando o assunto é venture capital climático. O Brasil e todo o continente africano somados recebem menos de 4% do capital global em climate techs. Ou seja, temos posição regional consolidada, mas seguimos invisíveis na agenda que realmente conta para o futuro da economia.
No Brasil, esse problema ganha contornos ainda mais dramáticos. Temos Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) bem definidas no Acordo de Paris e planos de transição ecológica em construção. Mas é raro ver a inovação tratada como prioridade de política pública. Governo, empresas e financiadores operam com lógicas distintas — e muitas vezes desconectadas das oportunidades reais no território.
Essa desconexão cria um efeito perverso: soluções com potencial transformador ficam órfãs. Não porque faltem, mas porque não encontram canais para maturar, escalar e se conectar com as prioridades climáticas. O Instituto Talanoa mapeou essa lacuna: o Brasil carece de um marco institucional claro que distribua papéis entre os diferentes agentes das finanças climáticas.
O resultado é fragmentação. Funções como articulação, regulação e mobilização de recursos estão espalhadas entre órgãos sem coordenação. Faltam pontes que integrem esses esforços às metas climáticas nacionais.
Essa fragmentação institucional não compromete apenas a efetividade das políticas — ela trava o capital. Bancos e fundos hesitam em apostar onde não há previsibilidade regulatória, rotas tecnológicas claras ou métricas consensuadas de impacto. O setor privado opera no escuro, sem orientação nem integração às estratégias de transição. Ainda assim, parte dele consegue pingar alguns recursos, movida pela clareza da oportunidade econômica e pelo entendimento de que quem chegar primeiro ajudará a moldar os novos mercados.
O que falta, portanto, não é dinheiro — é direção. E isso se reflete no orçamento: o volume dedicado à inovação climática é marginal frente às demandas. O Fórum Econômico Mundial calcula que precisamos de R$ 1 trilhão até 2030 para viabilizar nossa transição. Grande parte depende da capacidade de criar políticas que apoiem inovação em cadeias produtivas estratégicas.
A solução começa em casa. O Brasil precisa de um alinhamento estratégico entre governo, setor produtivo, academia e sociedade civil sobre o papel da inovação na estratégia nacional. Isso significa inserir o tema de forma transversal nas metas climáticas e criar canais formais de diálogo sobre gargalos e oportunidades reais.
Alguns sinais já aparecem no radar. O Plano de Transformação Ecológica do governo federal prevê marcos para bioeconomia, transição energética e finanças sustentáveis. No campo do financiamento, iniciativas como o EcoInvest e a Plataforma Brasil de Investimentos Climáticos (BIP), ambas coordenadas pelo BNDES, estruturam veículos para ampliar o fluxo de capital verde.
Esses movimentos se conectam a esforços do setor privado e da sociedade civil. O Nature Investment Lab , secretariado pela Climate Ventures e liderado por Banco do Brasil, BNDES, Itaúsa , Instituto Clima e Sociedade (iCS) e Glasgow Financial Alliance for Net Zero (GFANZ), reúne lideranças dos três setores da sociedade para fortalecer o ecossistema e impulsionar investimentos em Soluções Baseadas na Natureza (SbN) no Brasil.
Mas ainda falta uma estratégia nacional que articule essas frentes com escala, continuidade e prioridade política. Se a inovação continuar sendo vista como satélite da agenda climática, e não como motor, o Brasil perderá a chance de liderar uma das agendas econômicas mais relevantes do século.
A COP 30 pode ser o marco da virada — se o Brasil decidir assumir a inovação climática como motor de sua estratégia econômica para o século XXI.